Apesar de toda exposição voluntária vista hoje em dia nas redes sociais, a privacidade ainda se sobrepõe à transparência como valor social e jurídico – o que de certa forma permite a manutenção da corrupção que assola economias mundo afora. As informações tornadas públicas somadas àquelas produzidas voluntária ou involuntariamente podem construir com fidelidade seu clone digital, ao rastrear e combinar seus passos deixados online. Seria o Big Data o exterminador da corrupção em escala mundial no futuro?
A corrupção é um mal endêmico humano e está longe de ser exclusividade do Brasil. O País aparece na 69ª posição mundial do Índice de Percepção da Corrupção, entre 175 países, com 43 pontos. A escala vai de 0 a 100. Sendo 0 muito corrupto e 100 livre de corrupção. O abuso de poder confiado a políticos e servidores representantes do povo desestabiliza a organização social, bloqueia direitos humanos dos mais pobres, acarreta problemas de governança, traz instabilidade, cria sensação de impunidade e pode desnortear e até mesmo arruinar uma sociedade.
Estariam então os candidatos a cargos e posições públicos dispostos a abrir as caixas pretas digitais de suas vidas em nome do combate à corrupção? Ou ainda seguiremos socialmente dependentes de vazamentos seletivos produzidos por grupos rivais que buscam assumir o poder? Um dia a transparência selecionará por si própria os novos líderes ou o poder da oratória ainda será decisivo para apontar quem serão nossos guias e condutores na evolução social?
A corrupção é um problema grave que a automatização pode frear ou minimizar. Porém, somente se combinada à autorização de candidatos para tornar as informações públicas. E, enquanto dependemos da boa vontade dos políticos no Brasil, não parece que o Big Data possa exercer um grande papel neste sentido.
Já é possível alguém, bem ou mal intencionado, de algum lugar do mundo com acesso à internet descobrir tudo sobre você. Basta dominar as técnicas de monitoramento e espionagem digital (vide NSA). E será cada vez mais difícil escapar da comparação do você real com seu dossiê ou certidão virtual. O maior uso de smartphones e meios digitais no dia a dia irão aos poucos criar um banco de dados de suas atividades e ações pessoais que, ponderados, apresentarão um retrato fiel sobre você.
O único jeito de manter a privacidade é se esconder por trás de códigos de criptografia. Com o avanço da conectividade, da internet das coisas e da digitalização de documentos antigos, seu passado, presente e futuro estarão mapeados. Nada escapará do registro. Nenhuma ação, pensamento, manifestação ou sentimento. Sua figura poderá ser decodificada e formatada em questão de minutos. O problema é que tanto o vazamento de informações, como a descoberta das chaves de criptografia, arruinariam a credibilidade das corporações.
Então, é mais prudente acreditar que o combate à corrupção ainda se dará por meios convencionais, como o Portal da Transparência, que poderia ser ampliado, divulgando dados de servidores públicos, com cruzamento de informações da Receita e dos cartões de crédito. Até chegar à fundação da Agência Nacional Anti-Corrupção, com aproveitamento da tecnologia de Big Data, enquanto o mundo hacker buscará assumir a liderança e abandonar a vice colocação dentro do cenário atual.
– Documentos antigos digitalizados
– Informações cedidas por meio de publicações nas redes sociais e internet
– Permissões de acesso dado a serviços e APPs online
– Uso cotidiano da web
– Uso diário do smartphone
– Avanço da internet das coisas
– Automação da vida
– Convergência das informações virtuais
– Posts em redes sociais
– Publicações na internet
– Coleta de informações de localização (GPS)
– Navegação online com conexão via conta Google ou Facebook
– Permissão de coleta e uso de dados por APPs
– Monitoramento de sensações dos vestíveis (wear)
– Desencriptação e junção das informações produzidas virtualmente
Com sucessivos casos de corrupção trazidos à tona neste governo, conversamos com Rodrigo Souza, Data Manager da PSafe, e Thiago Marques, líder do Laboratório de Análise de Malware da PSafe, para entender como Big Data e os profissionais de segurança podem se tornar aliados da transparência e auxiliar cidadãos e países no combate à impunidade e na redução da corrupção no Brasil e no mundo.
Como Big Data pode representar um salto no combate aos abusos e frear a corrupção no Brasil?
Rodrigo Souza: Considerando que as informações sigilosas estão disponíveis para quem investiga, tecnologias de Big Data podem ser usadas para processar grandes volumes de dados ou buscar indícios de corrupção em trocas de mensagens através de análise de sentimento e estatísticas.
O maior uso da internet e o registro de toda atividade online no Brasil podem mapear corruptos e corruptores? Seria mais fácil se o Marco Civil tivesse conseguido manter a necessidade de empresas estrangeiras manterem os dados gerados no Brasil em servidores alocados no País?
RS: Acredito que não. Os dados que realmente importam são protegidos por lei. O caminho envolve decisões da justiça para se ter acesso aos dados. E tem também a questão da credibilidade das empresas de tecnologia. Elas farão de tudo para manter as informações salvas de acesso de terceiros.
Como gigantes de tecnologia podem ser aliados sociais ao desmascarar malfeitores, já que hoje em dia Google, Facebook ou Microsoft sabem praticamente tudo sobre nós?
RS: Esses gigantes vão tentar manter o sigilo até que a justiça os obrigue do contrário, sob pena de perderem a confiança dos usuários.
A disseminação de informações falsas dominaram as redes sociais na última Eleição. Você acha que para o próximo pleito, os boatos serão substituídos por vazamentos seletivos, mais técnicos e verdadeiros? Acredita que já existam hackers a serviço dos partidos políticos no Brasil?
RS: Infelizmente sim, a guerra digital continuará uma vez que é mais barata e eficiente do que a propaganda em TV ou o risco de talvez obrigar carteiros a trabalhar para o governo, por exemplo. Hackers, “bots”, dossiês falsos, boatos, tudo será usado. O que é uma pena. Nos EUA vimos o Obama usando tecnologias de Big Data para conhecer melhor seus eleitores, algo muito mais positivo.
Os malwares espiões terão lugar de destaque no combate à corrupção? Com isso, países tecnologicamente mais avançados, como Estados Unidos e Israel, saem na frente no combate ao problema?
Thiago Marques: Podem ter, sim. Desde que o objetivo seja capturar as informações pra combate à corrupção. Hoje em dia já temos casos de malwares que ao que tudo indica são desenvolvidos com algum governo por trás do grupo que trabalha no ataque.
Com o avanço da automação e digitalização, a privacidade está com os dias contatos? No futuro a vida das pessoas será um livro aberto? Ao menos das pessoas públicas?
RS: Não deveria. Todo app tem que preservar a privacidade. Mas sem dúvida há uma infinidade de aplicativos maliciosos que coletam mais informações do que deveriam. Com isso, existe um enorme banco de dados em construção na rede que, uma vez acessado, pode contribuir para não esconder segredos sobre a pessoa alvo da ação de espionagem, por exemplo. E uma vez o dado coletado, pode ser processado, tratado e usado.
O excesso de permissões de aplicativos representa o fim da privacidade do usuário comum?
RS: Sem dúvida. Aplicativos maliciosos podem capturar senhas de banco ou de redes sociais e diversas outras informações, muitas delas já comercializados no mercado negro hacker.
Existem outros perigos à privacidade presentes hoje nos smartphones?
TM: Aplicativos maliciosos podem capturar diversas informações do seu dispositivo, como SMS, lista de contatos, ligações recentes etc. Portanto é importante instalar aplicativos de fontes seguras e utilizar programa antivírus.
Como impedir que suas informações privadas acabem nas mãos de hackers e negociadas na internet?
TM: A melhor maneira de se prevenir é a conscientização. As pessoas têm que entender que tudo que é colocado na internet é ou pode vir a ser público, portanto é importante avaliar onde esta informação está sendo fornecida e se realmente é necessário fornecer este tipo de informação.
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